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As Normas de Auditoria e o aprimoramento das fiscalizações dos Tribunais de Contas
Por: Inaldo da Paixão Santos Araújo e Nelson Nei Granato Neto
“Toda redação deve ter um começo, um meio e um fim”. Eis uma típica lição de língua portuguesa de professores do ensino fundamental. É bastante lógico: todo texto deve (deveria) ter um “começo”, em que se introduz o tema que será discutido (o que vai ser dito), um “meio”, no qual o tema proposto é analisado (o dizer), e um “fim”, em que as conclusões da análise do tema são apresentadas (o que foi dito). Uma lição elementar que se aprende logo nos primeiros anos de escola, e que é válida desde a redação escolar mais simples até a tese de doutorado mais elaborada, passando por todos os trabalhos em que é preciso relatar a análise de um determinado assunto, inclusive em um trabalho de fiscalização.
Se os auditores dos Tribunais de Contas limitassem ao seu mister apenas com a lição mencionada no parágrafo introdutório, já ajudaria bastante. No entanto o País dispõe das Normas Brasileiras de Auditoria do Setor Público (NBASP), alinhadas às normas da Organização Internacional de Entidades Fiscalizadoras Superiores (INTOSAI, em inglês). Seguindo os princípios e requisitos expostos nessas normas, logra-se realizar um trabalho de fiscalização independente, com um padrão de qualidade e rigor metodológico internacionalmente aceitos. Colocando-se nesse ponto de vista, parece que essas normas trazem um conteúdo metafísico, um padrão de trabalho difícil de aplicar e atingir.
Mas, afinal, do que tratam essas normas? Na essência, elas apenas adaptam a típica e fundamental lição dos saudosos professores do primário ao contexto do trabalho que se desenvolve em entidades fiscalizadoras, como é o caso dos Tribunais de Contas. Podem-se dar nomes mais ou menos rebuscados, mas, no âmago, elas estabelecem que, independentemente da forma ou do contexto em que seja realizado, todo trabalho de fiscalização deve ter: (i) um “começo”, a fase do planejamento, na qual se levantam possíveis temas para fiscalização, selecionam-se os mais problemáticos e identifica-se, claramente, que tema será fiscalizado, os critérios que serão utilizados para analisá-lo, os responsáveis pela execução do trabalho, o custo envolvido e quais são os possíveis responsáveis por eventuais desconformidades, bem como para quem se destinará o relatório da fiscalização; (ii) um “meio”, a fase de execução, na qual se reúnem evidências suficientes e adequadas e avalia-se se elas estão de acordo ou não com os critérios identificados na fase anterior; e (iii) um “fim”, a fase de relatório e monitoramento, na qual, com base na análise das evidências, formulam-se conclusões e emite-se apontamentos aos responsáveis pelo tema auditado, os quais vão desde recomendações, visando à melhoria da situação observada, até a sanção de agentes públicos que cometeram irregularidades, recomendações e sanções, cujo cumprimento ou não é posteriormente monitorado.
As normas trazem, ainda, uma série de princípios que devem ser observados ao longo de todo esse processo, tais como o comportamento ético, independente e profissional das pessoas responsáveis pela fiscalização, a análise de risco, a busca pelo conhecimento, que é necessário para auditar os mais diversos temas, a preocupação constante com a relevância dos temas que serão examinados e suas conclusões e apontamentos, a documentação clara e organizada de todo o trabalho, entre outros.
Colocando-se nesse outro ponto de vista, as normas trazem objetividade, racionalidade e organização para as fiscalizações que observem os seus princípios, que nada mais são que o desenvolvimento das lições mais elementares de redação e organização de um trabalho científico. Assim, as NBASP são o grande instrumento para os Tribunais de Contas e seus servidores realizarem trabalhos com o rigor metodológico e o profissionalismo que o povo brasileiro merece (e paga para) receber.
Mas, sendo as NBASP tão lógicas, por que é tão difícil aplicá-las no dia a dia da fiscalização dos Tribunais de Contas? Aqui, levantam-se algumas hipóteses: dificuldades de se estabelecerem prioridades de problemas em meio a um caos? Confiança cega na intuição do auditor? Recusa em sistematizar e organizar o trabalho a ponto de deixá-lo mais transparente... e mais propenso a críticas? Essas e outras são questões que ficam para uma próxima reflexão.
*Inaldo da Paixão Santos Araújo é mestre em Contabilidade, conselheiro-corregedor do Tribunal de Contas do Estado da Bahia, professor, escritor. inaldo_paixao@hotmail.com
**Nelson Nei Granato Neto é mestre em Desenvolvimento Econômico (UFPR), analista de Controle (TCE-PR)